Fundação

10-08-2010 15:07

 

 ORDEM TERCEIRA DE S. FRANCISCO

 

No ano de 1427 foi fundada em Guimarães a Venerável Ordem Terceira de S.Francisco. A ela pertenceu a preclara senhora que foi D. Constança de Noronha, segunda esposa de D. Afonso, primeiro Duque de Bragança, senhora que em 1461 tomou o hábito de terceira franciscana e quis ser sepultada na igreja deste convento, amortalhada com o respectivo hábito. Com o decorrer dos tempos deve ter perdido a sua vita-lidade, razão que levou Frei António de Cristo, em 1615, a restaurar esta Ordem Terceira, com o objectivo de socorrer na pobreza os seus irmãos mais necessitados.

            

CAPELA

  A Venerável Ordem Terceira de S.Francisco tem a sua capela dedicada a Nossa Senhora da Conceição, cuja imagem estava colocada, em tempos idos, no único altar ali existente: é o Abade de Tagilde quem o afirma. Nos documentos incluídos no inventário do cartório da Ordem feito em 30 de Maio de 1834, encontram-se a referência mais antiga à Capela dos Terceiros, dizendo que a 15 de Maio de 1746 foram aprovadas as contas com as obras da sacristia e capela. Consta da acta de 25 de Junho de 1752 que a obra de pedraria foi adjudicada a António da Cunha Correia Vale por 4 mil cruzados, tendo sido resolvido aceitar as despesas não previstas no caderno de encargos da obra de pedraria. A 6 de Julho de 1753 foi deliberado pagar a obra de pedraria da capela, sinal de que a obra já estava concluída.

 

No entanto, a 4 de Julho de 1770, os mesários de então, insatisfeitos com o trabalho ordenado pelos seus antecessores, decidiram “reformar o risco do portal da capela e abrir uns óculos sobre a cornija”, obra que foi entregue em 17 de Outubro desse ano a Pedro Lourenço, e dada por concluída em 1774, como se depreende de uma deliberação de 19 de Maio desse ano.

 

EXTERIOR – A Capela tem fachada de estilo joanino, ao gosto italiano. A porta principal, em granito, de grande elegância, apresenta-se em dois registos, separados por uma cornija que se desenvolve horizontalmente. No registo inferior, está o majestoso portal de Pedro Lourenço, enquadrado por pilares fasciculados com duas colunas toscanas, e sobre a porta, emoldurado de ornatos, vê-se esculpido o brasão da Ordem Franciscana. Sobre ele, inserto num frontão ondulado cortado, abre-se um janelão com coroamento que assegura a iluminação do interior da coro. No registo superior, ergue-se uma peanha com a imagem de granito da Rainha Santa Isabel, ladeada por dois pilares, estrutura que termina com um frontão quebrado, com pináculos e uma cruz ao centro.

Todos os espaços da frontaria da capela que não se encontram ocupados com elementos de granito, são decorados com azulejos azuis e brancos de fins do século XIX, mandados colocar por deliberação de 4 de Setembro de 1860, “no gosto dos azulejos da frente do hospital”. Inicialmente, esses azulejos não abrangiam toda a superfície disponível, pois a parte inferior era revestida de placas de ardósia: placas que foram recentemente removidas e substituídas por azulejos idênticos.

A parede lateral da capela, em frente ao portal da igreja de S.Francisco, não foi revestida de azulejos. Nela se abre uma segunda porta, “travessa para huma alpendrada, que divide a Capella da Igreja de São Francisco”, no dizer da “Corografia”. Essa porta ostenta uma decoração do barroco final, abrindo-se ao seu lado uma janela para iluminação do interior da capela.

 

INTERIOR - Um arco cruzeiro separa o corpo da igreja do altar-mor, cuja talha foi executada em 1782 por José António da Cunha. O trono, hoje visível, esteve durante muitos anos oculto por um retábulo representando Nossa Senhora da Conceição, pintura de mérito de autor desconhecido do século XIX. Esse retábulo, de grandes dimensões, depois de devidamente restaurado por mãos competentes, foi colocado no coro-alto da Igreja conventual, como atrás se anotou.

Ao lado do altar, encontra-se uma bela imagem em tamanho natural da Imaculada Conceição, padroeira da capela, datada de 1904, obra de João de Afonseca Lapa, santeiro com oficina em Vila Nova de Gaia, notável pela elegância e realismo das suas obras, autor de dezenas de imagens espalhadas por todo o país, entre as quais algumas das figuras dos Passos do Bom Jesus do Monte, em Braga, e a imagem do Sagrado Coração de Jesus da igreja de S.Domingos de Guimarães, inaugurada em Agosto de 1880.

Até ao princípio deste século, venerava-se uma bela imagem de Nossa Senhora da Conceição que hoje está no primeiro altar, lado da Epístola, da igreja conventual. Para lá foi encaminhada quando a Ordem recebeu a escultura de Afonseca Lapa.

Ladeando o altar-mor existem duas boas imagens de madeira que, pelo estilo, devem datar de fins do século XVII ou princípios do século XVIII. Representam S.Francisco e a Rainha Santa Isabel, vestida com o hábito de terceira franciscana.

A capela teve, de início, um púlpito amovível que causava embaraços porque ocupava bastante espaço numa capela de tão discretas dimensões. Por isso, em 4 de Maio de 1834, foi mandado fazer um púlpito fixo: o que actualmente existe.

A capela tem dois altares laterais, despertando maior atenção o do lado da epístola, onde se veneram as imagens do Sagrado Coração de Maria e de Nossa Senhora da Boa Morte, esta em banqueta envidraçada. A imagem do Coração de Maria, apesar de mal restaurada em 1936, é notável pela doçura das suas linhas: é obra do famoso escultor romano, Giuseppi Berardi, o autor da imagem de S.Francisco que se encontra na Igreja conventual. Consta da acta da Mesa de 22 de Setembro de 1882 que essa escultura foi recebida de um anónimo em troca de uma outra que mais tarde regressou à Ordem Terceira. A recepção da imagem do Sagrado Coração de Maria foi comemorada em 24 do mesmo mês e foi entronizada no dia 8 de Dezembro desse ano, festa da Imaculada Conceição. Segundo informação do Padre Ferreira CALDAS, foi benzida pelo papa Leão XIII.

No altar do lado do evangelho esteve inicialmente colocada a imagem de Santa Filomena. Com a chegada da imagem da Senhora das Dores, de Soares dos Reis, escultura mandada fazer por António Peixoto de Matos Chaves em cumprimento de um voto de sua mãe, esta imagem passou a ocupar o lugar da imagem de Santa Filomena, que foi deslocada para um nicho do mesmo lado: hoje encontra-se na Sacristia-Museu da Capela. A imagem de Nossa Senhora das Dores está actualmente, como já se disse, no transepto da igreja conventual.

Nas pilastras das paredes laterais, sobre mísulas, estão três pares de esculturas que representam: as da frente, os apóstolos S.Pedro e S.Paulo; as do meio, os bispos franciscanos S.Luís e S.Boaventura; as do fundo, os mártires franciscanos, Santo Adjuto (irmão leigo, um dos Santos Mártires de Marrocos) e S. Pedro Mártir.

No coro, com balaustrada, há um órgão fabricado na segunda metade do século XVIII pelo organeiro vimaranense Luís António de Carvalho e adquirido por 350$000 por deliberação de 14 de Abril de 1818. É um órgão pequeno, que se podia deslocar como se se tratasse de uma peça de mobiliário. Foi restaurado recentemente.

Graças ao financiamento do Ministro da Ordem, o benemérito Comendador Cristóvão José Fernandes e Silva, o interior da capela foi revestido de azulejos emblemáticos, assim chamados porque a sua função decorativa é assegurada essencialmente por emblemas que se repetem: neste caso, o brasão da Ordem, o monograma da Virgem Maria e uma cruz com um cálice cruzados. Foram executados na Fábrica do Vale da Piedade, em Vila Nova de Gaia.

 

HOSPITAL

 

Em 20 de Dezembro de 1814, o Príncipe Regente autorizou a construção do Hospital da Ordem Terceira de S. Francisco, sendo em 17 de Janeiro de 1815 passada a respectiva provisão. Destinava-se esse hospital à assistência na doença aos terceiros pobres. Foi esse hospital inaugurado a 31 de Julho desse ano: Nessa altura, a fachada do edifício tinha apenas seis janelas, mas a abertura solene do hospital foi feita a 3 de Março de 1816, em sessão magna onde foram prestadas contas das receitas arrecadadas e das despesas feitas com a sua criação.

A história do hospital foi profundamente afectada pela extinção das ordens religiosas em 1834, medida de revanchismo político que se torna evidente através da atitude tomada pelo Governo, em 3 de Junho, ao mandar instaurar um inquérito sobre as ideias políticas professadas pelos frades franciscanos, com audição de testemunhas. Logo em 30 de Maio, a comissão administrativa dos conventos abandonados de Guimarães procedeu ao inventário dos bens pertencentes ao convento. No primeiro de Julho, a Fazenda Nacional tomou posse do convento e de todos os seus pertences, entregando a 7 de Agosto a Manuel José Pereira, co-mo depositário, todos os objectos inventariados com excepção das alfaias sagradas e ornatos do templo, que só foram entregues ao Estado a 16 do mesmo mês. Em 16 de Outubro foram vendidos os móveis e as roupas.

            Mas, do mal o menos, no dia 28 de Fevereiro de 1835, por carta de lei, a igreja de S. Francisco foi dada à Venerável Ordem Terceira de S. Francisco, que dela tomou posse a 6 de Agosto do mesmo ano. A Ordem Terceira, apostada em dar continuidade à actividade caritativa dos frades expulsos, logo no primeiro de Março de 1839, deliberou construir novas instalações para o hospital e acrescentar a fachada com mais três janelas do lado da rua de S.Francisco, tendo para o efeito sido gastos 8 contos de réis, comprando-se para tal onze moradas de casas por cerca de 10 contos de réis.

Mas tornava-se imperativo para alargamento da actividade social da Ordem Terceira que o Governo lhe concedesse o extinto convento. As primeiras diligências tiveram início em 1844, como se lê num projecto de lei apresentado na Câmara dos Deputados em 29 de Maio de 1850, onde se lê:

“A Venerável Ordem Terceira da Vila de Guimarães tem solicitado desde 1844, a concessão gratuita do edifício do extinto Convento de S. Francisco daquela Vila, contíguo à Capela e Hospital da mesma Ordem (a qual já está de posse da Sacristia da Igreja, assim como das varandas dos claustros, jardins, e portaria do convento, por lhe ser tudo concedido por Sua Majestade) para aumentar este Estabelecimento Pio, construir um cemitério, e proceder a outras obras de reconhecida utilidade, por isso que as avultadas despesas que fazia com o curativo dos Irmãos doentes, que eram sempre em grande número, lhe não permitiam comprar em praça aquela propriedade. O Governo, tendo exigido as convenientes informações a semelhante respeito, convenceu-se da justiça da pretensão referida Ordem Terceira, pelo filantrópico fim a que se dirigia, de ampliar os socorros a seus Irmãos desvalidos; mas não pôde resolvê-la, porque, pela Carta de Lei de 8 de Junho de 1843, apenas estava autorizado a dispor, em beneficio das Câmaras Municipais, Misericórdias, ou de quaisquer estabelecimentos pios, ou de pública utilidade, dos bens nacionais que não pudessem ser vendidos por nenhum dos mui diferentes modos que estabelecia; e o edifício de que se trata nunca tinha chegado a estar em praça. Hoje, porém, além desta disposição, acha-se o produto dos mesmos bens aplicado por lei ao fundo especial de amortização; mas sendo este indemnizado do valor que for arbitrado ao edifício (de que convém dispor, para não cair em completa ruína) para garantia da indispensável boa fé que deve guardar-se em todos os contractos, entende o Governo ser digna de toda a consideração a mencionada pretensão”.

Não surtiu qualquer efeito esta diligência, mas essa adversidade não esmoreceu a acção caritativa da Mesa Administrativa que, em 1853, pôs em prática o socorro domiciliário dos irmãos entrevados e, sem esperar pela resposta do Governo às suas diligências, lançou a primeira pedra do novo edifício hospitalar, com risco do arquitecto do Porto, José Luís Nogueira, obra que se foi fazendo por fases.

 

FACHADA NOBRE - Os trabalhos de pedraria ficaram prontos em 1877 com a conclusão da fachada nobre, em estilo neoclássico. É constituída por três corpos separados por pilastras, sobre cujas cornijas se estende a todo o comprimento do edifício uma balaustrada. No corpo central, num frontão, o emblema franciscano. Dentro de cada corpo, três varandas de frontão ondulado, apoiados num suporte de pedra que desce até uma janela larga mas pouco alta. Todo o espaço livre está ornado por azulejos azuis do século XIX, sendo de recordar que até há algumas dezenas de anos, a parte inferior do edifício estava coberta por um inestético lambrim de lousa, felizmente removido.

Em 4 de Outubro de 1858, realizou-se a cerimónia solene da inauguração do Hospital de Entrevados, instituído pelo benemérito António Joaquim de Carvalho, falecido em 15 de Dezembro do ano anterior, que havia deixado em testamento 17 000$000 réis e toda a sua mobília para a Repartição dos Entrevados. O Re-gulamento do Hospital foi aprovado em sessão de Mesa e da Junta Magna realizada em 23 de Julho de 1866.

  

MUSEU

No fim do século passado, Albano Bellino defendeu a criação de um Museu que guardasse de modo conveniente as obras de arte que se encontravam semeadas por todo o edifício. A Mesa Administrativa decidiu em Dezembro de 1889 pôr à sua o local que melhor lhe parecesse; e logo a 3 de Agosto seguinte, foi por sua iniciativa inaugurado sobre a portaria do extinto convento um pequeno museu onde fo-ram colocadas algumas peças de valor histórico e artístico, entre as quais um grande quadro a óleo sobre ma-deira, representando um Milagre de S. Francisco; outro, da mesma grandeza, representando a rainha D.Mafalda, fundadora do convento da Costa; outro, em cobre, representando o acto heróico de Judite; a grade do milagre do ladrão, que ostentava um letreiro nos termos seguintes: “ESTA HE A REDE Q S.TO ANT.O LANÇOU SOBRE O LADRAM MANOEL DIAS, A 29 DE ABRIL DE 1710”. O quadro da rainha D.Ma-falda, lê-se numa deliberação tomada em 2 de Abril de 1891, foi oferecido pelo Visconde de Sendelo, proprietário do Mosteiro da Costa, onde se achava em total abandono, com a condição de ser restituído se não fosse criado um museu em S.Francisco: isto para que não levasse descaminho. Hoje, essa tela e a outra de grandes dimensões representando a Veneração de S.Francisco, depois de cuidadosamente restauradas, encontram-se em lugar de honra, nas escadas que da antiga entrada do convento dão acesso ao edifício.

Foi este o primeiro e decisivo passo com vista à criação do Museu desta Venerável Ordem Terceira. Hoje, além da Sacristia da Igreja de S. Francisco, cujo recheio já foi comentado, há a considerar a antiga Sacristia da Capela que reúne também uma colecção notável de obras de arte:

  

 SACRISTIA DA CAPELA

 

 A Sacristia da Capela foi convertida recentemente em Sala-Museu para nela se guardarem e serem apresentadas com o devido realce algumas das peças de ourivesaria, pintura e escultura que constituem património desta Instituição.

Frente à porta, chama desde logo a atenção o nicho onde, por deliberação de 3 de Setembro de 1876, foi mandada guardar a expressiva imagem do Santo Cristo dos Passos, escultura da primeira metade do século XVIII, pois já é referida numa acta de 16 de Maio de 1738, realçada por um riquíssimo manto.

Dignas de uns bons minutos de observação são duas das mais valiosas pinturas desta Casa, ambas do famoso pintor João Glamma Ströberle, mestre de Francisco Vieira, “O Vieira Portuense”, datadas dos fins do século XVIII: “A Sagrada Família” e “Nossa Senhora do Leite”. Acerca delas escreveu Eduardo d’AL-MEIDA a quando da sua exposição na Sociedade Martins Sarmento, em Agosto de 1910: “são dois quadros excelentes, de uma rara espiritualidade de traço, como nesse perfil de Maria em que transparece, na divina tranquilidade sonhadora do olhar, o amor carinhoso e atento da mãe”. Ambas as telas foram em 2 de Agosto de 1843 oferecidas à Ordem pelo comissário Frei Manuel Luís da Conceição Guimarães.

Salientemos duas boas peças de mobiliário: um arcaz datado do início do século XVIII, onde estavam guardados os paramentos e outras alfaias para uso na capela, e uma mesa filipina com pelicanos, também do mesmo século.

Entre as peças de ourivesaria, cumpre destacar a custódia de prata dourada, datada do século XVII. É descrita por Alberto Vieira BRAGA nestes termos: “Tem um nó cilíndrico e nele, em baixo-relevo, as figuras dos Evangelistas. Na base, folhagens e serafins. O relicário está entre quatro colunas salomónicas que sustentam a cúpula encimada por uma estatueta de Cristo

De valor, um cálix de prata dourada, ornado com diversos emblemas da Paixão, e diversas cruzes processionais, de prata (as que não foram confiscadas durante as invasões francesas), algumas das quais per-tenceriam às muitas confrarias e irmandades erectas na igreja do mosteiro.

Das esculturas, é de referir, pela sua delicadeza, a imagem de Nossa Senhora da Conceição (do sécu-lo XVIII); uma pequena imagem de Cristo Morto, que, pela sua postura, se julga ter pertencido a um grupo escultórico representando o Descendimento da Cruz; e a imagem de Santa Filomena, oferecida pelo Comissário Fr. João Tinoco do Senhor da Piedade. Por decisão de 11 de Março de 1846 foi aceite a oferta e mandado fazer para a imagem, no lado do Evangelho, um altar em frente ao púlpito. Mais tarde foi deslocada para um nicho do mesmo lado para dar lugar à imagem da Senhora das Dores, de Soares dos Reis; em 1851, passou para a igreja conventual, para o Altar da Irmandade do Cordão e Chagas, mas em 1864 teve novamente de ceder o lugar, desta vez à imagem de S.Francisco. Foi retirada da veneração dos fiéis e guardada nesta Sacristia, como obra de arte, quando a Santa Sé concluiu não haver prova da existência desta santa.

Hoje, pode dizer-se que todo o edifício da Ordem Terceira é um verdadeiro Museu, já que não só a sua fachada é uma obra de valor arquitectónico como as suas salas e corredores albergam muitas obras de arte, algumas delas saídas das mãos de conceituados artistas.

 

PORTARIA - Entrando na portaria do edifício, aí se encontram os mais belos azulejos desta Ordem Terceira, cópia de um tipo de padrão usado em Portugal nos fins do terceiro quartel do século XVII. Têm “um potencial decorativo tão belo, que em séculos posteriores ele foi usado ainda, mas só em casos esporádicos, dado o custo elevado da sua confecção. Estes azulejos teriam vindo pois para a Ordem de S. Francisco por encomenda expressa, mas antes – diga-se – do fabrico mecânico do azulejo”.

Subindo a escada de acesso ao primeiro piso, podemos apreciar no cimo do primeiro lanço de escadas uma escultura de madeira de castanho representando Nossa Senhora do Rosário (século XVIII). Na parede, dois quadros pintados por António Augusto da Silva Cardozo (1835-1893) retratam a corpo inteiro: à esquerda, do Comendador Cristóvão. José Fernandes Silva, Ministro da Ordem Terceira que em 6 de Julho de 1875 outorgou na escritura de entrega à Ordem Terceira dos bens pertencentes ao extinto convento de S. Francisco, e que, entre muitas outras benemerências, promoveu o restauro da Capela; à direita, de António Fernandes de Araújo Guimarães.

No cimo do segundo lanço de escadas, frente à balaustrada e emoldurando a porta do Salão Nobre, encontramos mais dois retratos a corpo inteiro, à esquerda, de José António Fernandes Guimarães, e à direita, de António Joaquim de Carvalho, benemérito falecido em Dezembro de 1857 que legou 17 000$000 réis e toda a sua mobília para a Repartição dos Entrevados.

Ingressando no Salão Nobre da Instituição, nele se encontram descerrados os retratos dos reis D.João VI, D.Pedro V, D. Luís e D.Carlos, ligados intimamente à história recente desta Ordem Terceira. Quanto ao retrato de D.João VI, oferecido à Ordem por D.Rosa Joaquina Viegas de Leão, em 3 de Setembro de 1854, o nome do autor encontra-se numa inscrição difícil de decifrar, feita em cursivo numa travessa justaposta à moldura que hoje segura a tela. O retrato do rei D.Carlos foi pintado também por António Augusto da Silva Cardoso.

Em todos os andares do edifício, encontramos variadíssimas pinturas, em madeira e em tela, representando santos franciscanos, ex-votos, cenas de temática religiosa e mais de duzentos retratos dos beneméritos da Ordem, alguns de grande valor. Entre estes retratos é de salientar a Colecção de Roquemont.

 

COLECCÇÃO DE ROQUEMONT

 

Augusto Roquemont nascido em Genebra a 1 de Julho de 1804. Chegou a Lisboa no dia 24 de Agosto de 1828 chamado pelo príncipe de Hesse Darmstadt de quem era secretário (e filho natural). Estava em Guimarães na Casa do Arco pertencente ao Conde de Azenha quando o príncipe de Hesse Darmstadt dele se despediu para regressar à Itália, e nesta casa permaneceu durante anos. Nela pintou infatigavelmente pois era um retratista muito procurado. Morreu no Porto a 24 de Janeiro de 1852. Dele escreveu Almeida Garrett: “artista distinto, cujo principal carácter e merecimento é a verdade, por uma longa residência no Minho é que se fez português, artista português legítimo, como oxalá que sempre sejam todos os nossos naturais”. Reportando-se à sua presença em Guimarães, assim escreveu Alfredo Guimarães: “Das obras realizadas em Guimarães, no retrato, costumes e paisagens, pelo pintor Augusto Roquemont, durante os doze, ou pelo menos, dez anos que aqui residiu, basta dizer que entre o melhor no retrato e na pintura de costumes realizadas pelo ilustre pintor no nosso país, entre, na sua quase totalidade, a obra executada em Guimarães”.

Entre os retratos da galeria de benfeitores é de justiça salientar o retrato de Frei Manuel Luís e, sobretudo, o dos que deram maior contributo para a construção do Hospital da Ordem, sendo de realçar o quadro de grandes dimensões (2,50 x 1,70 m) que representa, em sessão, a Mesa Administrativa de 1815, peça de notável valor para o estudo dos trajes e adereços da época.

 

***

 

As preocupações da Mesa Administrativa não se limitavam à área hospitalar: pretendendo dar continuidade a uma tradição secular, abriu em 13 de Fevereiro de 1865 uma escola, desta vez dedicada ao ensino de aritmética e geometria aplicadas à indústria.

 

Entre os documentos mais importantes para a Ordem Terceira em poder do Arquivo Municipal de Alfredo Pimenta, em Guimarães, encontram-se alguns datados de 1875 e 1876 relacionados com a concessão do edifício do extinto convento à Ordem Terceira de S. Francisco. Deles destaca-se a carta de El-Rei D. Luís, de 4 de Março de 1875, que estabelece tal concessão, abrangendo “o edifício do convento, terreiro, jar-dins, claustros, dormitórios, enfermarias e mais pertences do mesmo edifício, além do que a dita ordem já possui”, para alargamento do hospital e estabelecimento de duas escolas gratuitas de instrução primária para ambos os sexos, a cargo de professores habilitados. Em contrapartida, era-lhe exigido o pagamento de 2 contos de réis, pagamento que foi satisfeito a 6 de Julho do mesmo ano quando, pelo tabelião José da Silva Basto Guimarães, foi celebrada a escritura da entrega dos referidos bens, em que outorgaram, por parte do Regimento de Infantaria 3 (que então ocupava o extinto convento), o Coronel Isidoro Marques da Costa e por parte da Ordem Terceira, o seu Ministro, Cristóvão José Fernandes da Silva. As escolas primárias, criadas pela Ordem Terceira de S.Francisco em cumprimento do compromisso assumido, foram solenemente inauguradas no dia 2 de Agosto de 1885. E no dia 14 de Novembro de 1887 foram instaladas as oficinas de ensino profissional, tendo por fim dar o ensino das artes e ofícios aos Terceiros menores ou filhos de Terceiros, podendo na falta destes serem admitidos menores indigentes, legalmente autorizados por seus pais. Incluíam três oficinas: tipografia, encadernação e carpintaria. O seu regulamento foi aprovado por deliberação de 6 de Maio de 1888. Infelizmente, estas oficinas foram extintas dois anos depois.A história mais recente desta Venerável Ordem Terceira demonstra cabalmente que soube dar continuidade à tradição deixada pelos religiosos franciscanos. Assim: em 1905, o benfeitor António Francisco da Costa legou 29:100$000 com a obrigação de criar uma creche, e em 20 de Março de 1907 foi aprovado o seu regulamento interno. As primeiras crianças foram recebidas a 4 de Maio seguinte: em 27 de Janeiro de 1941, em assembleia geral de Irmãos foi deliberado dar cumprimento ao legado de José Pereira Torres Carneiro que deu à instituição 100 contos de reis e metade do remanescente da sua fortuna para a construção e administração da “Família Maternal” para recolhimento, sustento e protecção de raparigas seduzidas e abandonadas.

Nos dias de hoje, a Ordem Terceira mantém de pé uma intensa actividade assistencial, a cargo das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras, onde se procura realizar no dia-a-dia a mensagem de Cristo e do Patriarca S.Francisco, a quem um Papa chamou “o mais cristão de todos os cristãos”. A par dessa acção existe e existirá sempre uma grande preocupação pela manutenção, conservação, restauro e divulgação do espólio cultural que lhe foi legado por muitos séculos de História.

A publicação deste livro insere-se nesta linha de pensamento.

 

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